Hoje ao olhar uma fotografia antiga, fiquei inundada num poço profundo e escuro de tristeza e nostálgia, foi isso que pensei sentir, como se não conseguisse respirar de tanto que a água translucida me empurrava para baixo... e eu sem pé..
Retirei a fotografia do suporte de cartão empoeirado, toquei-a com o meu dedo indicador e com a ponta do meu polegar, como se acariciasse a testa de um recem nascido.
Olhei-a de soslaio como se a quisesse desnortear e afastar,( em vão, percebi num ápice) olhei-a mais um pouco, tentei recordar algo, mas tudo o que senti foi um misto de perda e saudade, doçura e paz, paradoxo e horizonte. Como se esntrasse numa loja de doces e não me deixassem escolher nenhum, e eles ali à minha frente, tão longe e tão perto.
Acho que estávamos os dois dentro de uma muralha de problemas na altura em que o momento foi aprisionado, e pensar que estava protegida pelo meu príncipe!
O beijinho sempre que chegava a casa.
A camisa vermelha com quadrados pretos.
A voz firme e elevada.
A mão grande que segurava a minha pequenina e ainda curiosa.
Ele era tudo isso.
Ele era tudo para mim.
A doença afastou-o da menina dos seus olhos.
Ao pegar a fotografia, ele voltou por breves momentos, para de novo me abandonar.
Apeteceu-me chorar, mas ferrei os olhos, comprimi os labios, respirei fundo, não fui capaz, mais tarde, tenho muito tempo.
Agora sei porque é que as coisas mudaram, não foi porque o vento correu mais depressa, nem porque assim tinha de ser, foi porque eu sou egoísta e mimada.
Agora sei porque é que preciso da fotografia para o amar. É simples: Ele desiludiu-me.
Perdi-o, e jamais o perdoarei por isso. O que sou hoje, são os restos dum coração destroçado, o coração sa menina do papá.
Receio tanto essa ilusão infantil que não deixo que o passado se entranhe na minha actividade cerebral, preferi desligá-lo e acorrentar as celulas num espelho ensanguentado e quebrado.
Ironicamente o passado reencontrou-me num momento de fragilidade feroz e bastou o tal pedaço de papel fotográfico para que tudo voltasse.
O papel de parede.
A camisa vermelha com quadrados pretos.
A bica depois do jantar na chícara amarela torrada.
O despertar para as 5 da manhã.
O cansaço do final do dia.
O olhar perdido que se perde na lente da máquina.
Os "bibelots" esquematicamente expostos na prateleira...aquilo era o meu mundo, aquele que tenho hoje em nada se assemelha. Tenho-o mas não me chega, e quero tudo menos saber aquilo que sei hoje: que um dia fui iludida por um senhor que descia a escadaria de um palácio nos meus sonhos, que passava por um relógio gigante guardado num cubo de vidro e o fazia trabalhar, que fazia adormecer toda uma aldeia caiada de branco banhada por um rio calmo e fresco numa noite de fim de Verão. A aldeia continua a dormir desconhecendo que escrevo sobre ela.
Sonhamos todos os dias mas poucos sao os sonhos que guardamos no coração, eu guardei este e acabei de vos contar, apenas a fotografia é real.
3 comentários:
Li o teu sonho, li-o bem até ao fim... Vi a foto do teu passado... Não consigo deixar de te dizer que as melhores lembranças, do que passamos, do que vivemos, ficam connosco até ao fim...
"O beijinho sempre que chegava a casa.
A camisa vermelha com quadrados pretos.
A voz firme e elevada.
A mão grande que segurava a minha pequenina e ainda curiosa."
Isto é parte de nós... Uma parte para lembrar..... sorrindo =)
Desculpa entrar assim pelas traseiras, desculpa não bater à porta antes de entrar, sequer, na tua história, sei que de ti nada sei, e que o que digo pode ser criticado por isso mesmo... pode até não ter qq fundamento, mas foi como o entendi e como te entendi também...
beijo** (peço desculpa)
ahhh e tenho que começar a vir aqui ver o que dizes dos filmes =)
Posso tar errado mas acredito k a tua dor e partilhada, a mm pessoa k t desiludiu tb deve sofrer por ter-t desiludido. Es a filha k kalker pai e mae gostariam d ter, eu gostava d ter uma filha assim (qd tiver mais idade claro). Tu sabes k sofro do mm mal, apesar d mais intenso axo eu, n sei akilo k sentes exactamente...ker dizer pensando melhor e completament diferent pk eu sinto desilusao, raiva, odio...sentimentos k gostava d n sentir mas eu n consigo perdoar...e um grande defeito bem sei, acredita k ja fiz td pa mudar isto mas n da, ja mudei mt coisa ma em mim mas...! tenho esperança k um dia td volta a ser cm antes pa ti, torço para isso e rezo tb, rezo so por kestoes importantes.
O texto ta lindo, alias td o k escreves e bom mas este e diferente*
Beijinho Sis
Escreves bem..tao bem, que foste capaz de escrever tudo aquilo que eu penso e tudo aquilo pelo qual sofro também. Aquele amargo que sentimos quando alguem diz: "o meu pai isto", "o meu pai aquilo" e nós,apáticos,gostávamos de ter um motivo para falar do nosso,mas é tudo vago,tudo triste,por causa de um passado que, por vezes, sabemos que é algo que nao conseguimos explicar mas,mesmo assim, nao perdoamos. Dói demasiado. Sabes que quase chorei. Senti cada palavra desse teu texto, como se fosse minha. Como que por coincidencia quase o escreves-te por mim. Embora em situaçoes diferentes, a mágoa, penso, é semelhante.
beijo de mim para ti :P *
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