sábado, julho 14, 2012

Já passaram muitas horas

Já passaram muitas horas. Muitas, desde que nos conhecemos. Um encontro numa noite fria de Novembro. Um passeio ao luar no qual trocámos impressões sobre Polanski, sobre influências e imagine-se... anginas. A despedida foi feita debaixo de chuva após um ameaço de assassinato.
Passaram-se algumas horas e voltámos a encontrar-nos. Desta vez almoçámos juntos num Museu de Cinema e à mesa com Tim Burton. Não me lembro o que comemos, mas recordo-me do à vontade, da cumplicidade e da promessa de nos voltarmos a ver. Passaram-se algumas horas e um terceiro encontro. Um novo jantar numa mesa "zen", um beijo novamente à chuva, mas desta vez com um tecto de carro para nos proteger e a benção de Emily Dickinson.
Já passaram muitas horas e continuamos a crescer. A casa está montada, os gatos criados, seguir-se-ão as viagens, os descendentes e todos os restantes dias das nossas vidas. Parece que foi ontem, parece que foi há uma eternidade, temos a certeza de tudo mas é-nos difícil defnir criteriosamente o que os dias e os meses passados significam na linha cronológica das nossas vidas. Não importa quantos dias vivemos, importa sim o que fazemos deles não é? Se assim for estou orgulhosa de todos que que passei a teu lado e preparada para os que estão para vir ao som das estações dos anos cada vez mais imprevisíveis, loucas, insensatas e cruéis para a terra.
As cores estão misturadas na tela, de azul a roxo, misturei branco com vermelho e agora tenho um cor de rosa despretensioso e carregado de força. Carregada também está a nódoa no pano que uso para proteger as pernas enquanto pinto mais uma tela, nada a fazer, está condenado o pobre coitado. Agora é um pano tingindo, desbotado, um pano dotado de uma arte imaginada por uma cabeça louca parideira de ideias destituídas de qualquer semelhança com a realidade. As ideias são apenas sonhos em carne viva, mas apenas porque precisam sangue para serem algo mais, mais carne e menos ferida, mais cicatriz que agora é carne lisa e fértil para novas sementes.
Falta-nos a noite mágica de Setembro, o brinde, o branco, o lacre. Falta-nos o cadeado preso à grande que vai conhecer todo o nosso amor e todas as horas que já vivemos juntos, falta-nos as orelhas da Minnie e a doce Angelina. Falta-nos todos os dias depois disso. Falta-nos o dia em que o vamos trazer para a nossa casa, o dia em que ele vai conhecer as nossas papoilas, brincar com os gatinhos e comer as papas feitas pelas avós. Passaram-se algumas horas e mal posso esperar pelas que estão para vir. Vá relógio, ordeno-te que te apresses.