E porque tudo o que vejo, vejo como nos filmes. E porque tudo o que fazemos e sentimos pode ser recordado nas asas de um caleidoscópio em pleno movimento. Se há "acção" eu revelo por aqui.
terça-feira, setembro 06, 2005
Michelia Champaca
Magnólia: género de árvore em flor aromática.
Este é o texto mais difícil que alguma vez me propus a escrever, é o que acontece quando gostamos demasiado de alguma coisa;ganhamos a terrível tendência para ver beleza em tudo...até em sapos esborrachados.
Por achar este filme tão descabido e tão natural(ou não, como verão em diante)este foi um dos primeiros dvd's que adquiri a um preço apetecível.
Quem o vê uma vez não o pode perceber na íntegra, e quem não tem paciência para o ver mais do que uma vez, rever capítulos, fazer "slow" em determinados momentos, prestar atenção a deixas, não vale a pena porque nunca chegará a nenhuma conclusão satisfatória.A histórinha de que "a primeira visão é que conta", aqui não enche estômagos vazios e ávidos de nutrientes.
Primeiro de tudo: eu não percebo a minha vida, nem o mundo que me rodeia, Magnólia trata destes dois assuntos, logo toda esta incompreensão existêncial dá lugar a uma lógica bastante defensável.
Magnólia não se propõe a fazer sentido tal como a vida não faz. E neste ponto tanto Paul Thomas Anderson como David Lynch partilham um estilo a nível de argumento,mas quem precisa de um fantasista Lynch quando temos um Anderson puramente humanista??!!
Fico sempre fascinada quando alguém decide não fazer um filme centrado numa só história mas sim em muitas, ligadas por um fio condutor(imperceptível para os intervenientes).
Se pensarmos bem nenhuma destas histórias tem que se ligar , nenhuma das personagens é motivada por uma qualquer força maior...não, aqui tudo se prende com decisões autónomas, o verbo chamado a prestar declarações é ESCOLHER, a vida faz-se de escolhas e elas conduzem-no por caminhos longos, sós e penosos.
Podia ser tudo um gigantesco mal entendido, sabem como é : "fulano de sicrano conheceu sicrano de fulano e etc...", coisas acontecem, e não têm que ser explicadas com respostas plausíveis, ou justificações científicas que só nos fazem desperdiçar o tempo e a memória. Mas por outro lado , se quisermos encontrar razões para tudo...muitas situações podem ser exploradas(adiante).
O medo é a porta que nos aprisiona.
O passado é a chave, é nele que se encontram todas as respostas, dele remetem os nossos actos e irradia o nosso futuro: "Podemos cortar com o passado mas o passado não corta connosco".
Neste dia de chuva ( primeiro de água propriamente dita e mais tarde de sapos), todas as personagens se cruzam, conhecem-se, ignoram-se e o mais importante redimen-se consigo próprias, com o mundo, com a vida e com a morte (essa que nunca se esquece de voltar).
Por maior que seja o arrependimento, o mal já está feito, as feridas já sangram - não há reparação possível e o relógio tic-tac, tic-tac...
Tudo é possível, aquele que só quer amar, "Eu tenho mesmo amor para dar. Só não sei onde o pôr.", aquela que encontro o amor fê-lo tarde demais: "sabe o que é dormir na cama com a morte?", aquele que se redimiu no fio da navalha, aquele que por ser o mais esperto carrega um fardo...e a história repete-se de trás para a frente, e de frente para trás...a incomprrensão tem destas coisas, ou estarei apenas a seguir o caminho mais fácil??
A chuva cai, o dia está no limite e as personagens encontram-se na sua maior profunda dor, este é o momento em que todas cantam (Wise up de Aimee Mann), elas dizem: " Isto não vai parar, por isso desiste.", este é o clímax do sofrimento e o inicio da absolvição que chega finalmente com a chuva nocturna.
As personagens são todas tocadas pelo "trágico", a de mr Cruise na cena final é arrebatadora e brutal - perdoar não é esquecer - a solidão é demasiadamente dolorosa e é ele quem pede: " Não vás. Não vás." ao pai moribundo, aqui está uma das chaves de que referi atrás; se folhearmos as nossas empoeiradas bíblias sagradas e procurarmos no Êxodo versículos 8:2 podemos ler: " Mas se recusar deixá-lo ir, eis que ferirei com rãs todos os seus termos".( não estou a inventar nada)
A chuva de sapos por mais estranha que pareça, não abala nenhuma das personagens verdadeiramente, assustam-se é um facto, mas a única que se pronuncia é Phil o enfermeiro bondoso e conciliador.A chuva significa uma prece atendida, uma absolvição.
E não ficamso por aqui, 8 e 2 são dois números importantes, porque existiam 82% de probabilidade de chuva, e 8 + 2 são 10 o número de personagens em relevo na película.
Ilógico? Arrisacamo-nos a ir mais longe?
O menino rapper que salva Linda e tenta ajuadr o nosso polícia a desvendar um caso de homicídio ao cantar diz: " Eu sou o profeta. Quando tudo se complica deus faz chover..."arrepiados??
E mais, a arma que o polícia perde para seu desespero, aparece mais tarde nas mãos do mesmo menino que corre com ela não se sabe para onde, e eis que a arma reaparece...no final da chuva de sapos para felicidade do polícia, como que lançada dos céus.
Confusos, ou é até tudo muito racional?
A chuva cai porque "aconteceu mesmo" como diz o quadro, e " é uma coisa que acontece" diz o rapaz prodígio;se fosse teatro, eu apostaria em Brecht!!!
Momentos aparentemente surgidos do nada marcam um dia crucial( não para o resto do mundo que não as 10 personagens), se calhar sempre que algo de grande acontece, chovem sapos, talvez nós não os vejamos, e sejam só visíveis para quem é/foi decisivo. Se calhar estão a chover sapos agora, e nós nem sequer nos damos conta, porque este é somente mais um dias das nossas vidas.
Como diz o narrador: " Nesta minha modesta opinião há bizarrias a acontecerem a todas as horas. E isto continua sem parar.".
Magnólia é delicioso, frustrante, arrebatador, incomprrensível...bem depende do modo como o vemos...é um espelho da vida,a correr numa encruzilhada destinada a recuperar um momento fugaz, aquele pelo qual esperamos todos os dias e que quando finalmente percebemos, sorrimos.
"Ás vezes as pessoas precisam de serem perdoadas...
Mas perdoar o quê?"
Todas as expressões entre aspas e em itálico são traduções livres do argumento original do filme Magnólia de 1999 com Melinda Dillon, Tom Cruise, Julianne Moore, John C.reilly, Alfred Molina, William H. Macy, Philip Seymour Hoffman, entre muitos, muitos outros.
Arevam-se a ver.
o título deste blog, parece ser descabido mas não é, juro.
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1 comentário:
Este comentario pode nao ter muito haver com o filme , mas acima de tudo e preciso perguntar : O que e que se passa com Tom Cruise , que depois de interpretacoes tao inspiradas como a deste filme , parece estar ...... como hei.de dizer ....... Ah , ja sei : completamente doido varrido , que nem num filme como War of The Worlds consegue carregar a sua personagem de uma densidade gramatica , que seria de esperar de alguem naquela situacao ? Sao coisas dos tempos ...
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