domingo, outubro 30, 2005

Sangue

Il sangue di Cristo, Bianca Maria Romano Leio as palavras dos outros e percebo o quão livres não são. Quero tanto escrever, ser livre como elas, ao falarem-me aos ouvidos, ao sussurrarem-me lamentos... E eu escuto-as. As pessoas, essas gritam-me mentiras: " É verdade!" juram elas. Mas eu sei o que sei, e não me engano, e as palavras voam para longe. Regresso a mim, tenho pressa em acabar. Quero cantar mas sinto-me amordaçada. As minhas asas colaram-se uma na outra e conspiram abraçadas contra mim, contra mim que lhes dei vida. Foram elas quem raptram as palavras, as palavras que não são minhas, porque são livres, e elas soltam-se porque não passam de palavrase para elas é fácil. Mas como são fortes! E as asas, essas sim minhas, como são fracas! Ao acabar, isolo-me confusa no meio dos outros. Perco o chão, sufoco no ar que os outros respiram. Afogo-me nas lágrimas que não choram por mim. As palavras que voltaram, agora livres, escorrem para o papel como que meu sangue sejam. Sinto-me engradecer na minha fraqueza... o mundo fecha-se. Amanhã volta a força, com novo sangue, o sangue que é meu, meu e das palavras.

quarta-feira, outubro 26, 2005

Alice

Alice angustia, revolta, sufoca, entristece, diminui-nos. Faz-nos perceber porque é que as pessoas são mais do que pessoas, são muito mais do que isso, são parte de nós e se desaparecem, então também nós desaparecemos. É sem dúvida uma experiência dolorosa assistir a Alice, muitos daqueles que já se confrontaram com a dor da perda de um filho cruzam-se com todos nós todos os dias, no metro, no comboio, nas 'casas de sandes', na rua. Nunca percebemos a sua dor simplesmente porque não vemos essas pessoas, limitamo-nos a olhar e a passar porque temos mais com o que nos preocupar...daí a nossa surpresa quando uma criança nos olha e nos sorri aparentemente do nada, mas a criança sabes porque é que o faz, nós é que já perdemos essa delicadeza pura. A perda de um filho é a maior dor que alguém pode sentir (não duvido), pior do que isso é a incerteza... porque perante a morte nada mais podemos fazer a não ser recordarmo-nos todos os dias dessa pessoa mantendo-a viva aos nossos olhos, mas não saber se ela 'partiu', se ela respira, se ela ainda sorri, dor maior não deveria ser humanamente suportável. Alice fala sobre a ausência, a perda - de si mesmo- o silêncio, os tempos mortos, as acções mecânicas inatas do ser obsecado(se me é permitido falar nestes termos), as tentativas, as desilusões, as frustrações, o medo da verdade, a esperança no reencontro, e sobre o inverno desolador que reina os nossos corações. Desde o início sabemos qual o desfecho do filme, infelizmente são poucos os casos que terminam com um sorriso na cara daqueles que procuram incessantemente por algo que ninguém (nem Deus- para os crentes) deveria ter o poder de os privar. Alice desapareceu a 17 de abril de 2003. Tinha cabelos encaracolados castanhos claros (como os do pai) e vestia a bata do infantário por debaixo de um casaco azul.Desde esse dia nunca mais foi vista. Inês Batarda é simplesmente fantástica, ela é a mãe da sua menina qua passa os seus dias num estado de completa apatia agora que perdeu qualquer vontade de viver ou amar. Nuno Lopes é o pai de Alice que é também um actor, que através da sua profissão escapa ao drama da sua vida, sendo o palco o seu refúgio e local onde recupera as suas forças para mais um dia de rotina na sua busca solitária na grande Lisboa, com a juda de pessoas que instalam as suas camaras em pontos estratégicos da cidade, 'fazendo o que podem' na busca, de forma relutante ou até despreocupada...é que eles não acreditam. A banda sonora acompanha a obra de forma magestral, cada nota de piano é como que um passo deste desolado pai, ou um suspiro da mãe, ou um baixar de olhos de um comum peão...O azul chamou-me a atenção, é que além de tudo isto Alice é ainda ums obra visualmente fascinante, como se a qualquer momento o écran pudesse ser invadido por uma queda de água apaziguadora, que nunca chega. O azul predomina. Os ingleses dizem estar 'blue' quando estão tristes. A água ao reflectir o céu torna-se azul. A multidão é cinzenta, ou será azul? O casaco de Alice era azul. Vi Alice não como um simples filme, mas quase como se estivesse a ler um poema, ou melhor um hino cantado a todos aqueles que sofrem em silêncio por causa de um acto tão cruel como levar algo que não é seu, sinto que as minhas palavras não chegam para explicar o que sinto, é que sinceramente não consigo perceber. Só sei que a vida deixa de fazer sentido. O mundo deixa de rodar. A incerteza apodera-se do nosso espírito...espiríto??Acredito que a dor ultrapassa essa barreira, dilacera a carne,faz o sangue deixa de correr. Ficam palavras por dizer, o amor incindicional que une as pessoas não consegue cortar o véu negro da dor, que ele é tão bem costurado que faz a menina Alice perder-se num outro mundo(não o das maravilhas), regido pelo vazio,pelo silêncio... Mas o Amor é só um sentimento, não traz ninguém de volta e a vida continua. Alice agora é passado para os outros, e constante para aqueles que amarão sempre a menina dos seus olhos. As duas cenas finais do filme decidem-no( se é que ele não estava já decidido desde o primeiro segundo...), a escolha é feita: procurar Alice ou viver? Para Lewis Carrol a fonte secou, mas a vida, essa subsiste, Alice também.

sexta-feira, outubro 14, 2005

O que conta é a beleza interior

O Homem é seduzido pela beleza, sempre o foi desde o mais remoto dos tempos. A beleza é dificilmente explicável bem o sei, porque não se resume a uma beleza. Fazemos a distinção tão comum nos nossos dias entre a física e a interior, o que o Homem não sabe é que a beleza física é vísivel, palpável, apreciável... limitada, mais limitada do que muitos imaginam. A outra , a chamada interior, essa nunca se corrompe, não se extingue. Consegui até perceber que a interior tem ainda outra faceta incrível, é que como poucos sabem, a beleza interior irradia, tem uma luz própria, não se importa de partilhar. A beleza física é egoísta como poucas, fecha-se atrás de uma porta de metal e grita "É minha, minha e não tua!", tira tudo e não deixa nada. A interior torna os outros bonitos, arranca-lhes sorrisos, fá-los felizes. O nosso erro é querermos o imediato na palma das nossas mãos, queremos a beleza mais visível que conseguirmos porque não temos tempo para a outra, os outros que se preocupem com eles próprios. No fundo é como a estória da Rosa e do Rouxinol...ele cantava maravilhosamente e não suportava a dor dos que sofrem por amar, ela a rosa, queria-se vermelha e bela, vermelha de sangue e bela de amor. O rouxinol cedeu, cantou uma última vez enquanto dava cor à bela rosa, mas aqueles que se amavam deixaram de o fazer, e o seu esforço foi em vão. Os amados separam-se, o rouxinol morre ao deixar o espinho da rosa cravar-se no seu coração, dando-lhe todo o seu sangue. A rosa fica vermelha do sangue do rouxinol, a rosa vermelha é esquecida e deixada na lama de uma noite escura de Inverno, porque o rouxinol morreu ao dar-lhe beleza. A rosa que era vermelha, fica sozinha. Bela mas sozinha. O mundo é mais do que aquilo que os nossos olhos conseguem ver. O mundo só começa realmente quando fechamos os nossos olhos.

sexta-feira, outubro 07, 2005

Parabéns maninha

Nem sempre é fácil escrever sobre de quem se gosta, principalmente quando se gosta muito e quando essa pessoa é uma das principais da nossa vida. Sabes que és!! Se fosses actriz escrever-te-ia um argumento arrebatador para que brilhasses numa luz poderosa e só tua, mas primeiro teria que ter o dom da escrita e a imginação de uma poetisa para criar um belo poema digno de ti. Serias talves uma femme fatale, não, não que digo eu... Serias uma deusa do Olimpo, daquelas que encantam o chão que pisam, enfeitiçam os seres para que só para ela eles olhem, possui a bondade de poucos neste mundo e voa sobre o mar calmo, mas é nesse momento que um golpe do destino rasga a barreira do divino uma última vez ...(porque a esse nem as deusas escapam...) o mar revolta-se, a tempestade é sentida pelos pescadores que puxam os seus barcos para a areia, um relâmpago encadeia o horizonte, o trovão, esse ensurdecedor vilão condena as asas da deusa, ela cai no mar. As ondas devolvem-na à terra, os pescadores exclamam que jamais viram semelhante beleza, a deusa olha à sua volta e percebe que as suas asas cairam e já não é eterna, mas não se importa, sabe que agora vai entrar na vida de alguém que a ama muito, de quem nunca se separará. A deusa esquece que foi deusa. A deusa esquece que foi eterna. Mas eu lembro-me que ela é eterna no meu coração. Eu lembro-me que a minha irmã é a deusa.