Um olhar meio escondido por uma franja desequilibrada, fugia do meu.
Eu, vagueava pela estação para desentorpecer os músculos, andava de um lado para o outro calma e teimosamente, pensando que nestas horas os minutos parecem sempre uns caprichosos que comandados pelos ponteiros de um relógio, fazem batota e demoram mais que o normal, e o relógio nada faz. Péssimo patrão!
Nada de carruagem, mandriona que nem para chegares a horas prestas!
Nisto, volto a trocar o olhar com o outro , percebi porque fugia do meu... não eram iguais. O meu via através de dois olhos, o dela apenas por um. Uma deformação, um acidente, um motivo entre tantos que não conheço e possivelmente nunca irei conhecer.
A rapariga, tinha a minha estatura, possivelmente a minha idade e a cor dos cabelos igual à dos meus. O seu olhar era meigo, quase inocente, mas tinha força, a força de seguir em frente independentemente de tudo. Ela, sentada no chão, encostada a um painel publicitário com a mochila aninhada nas suas pernas, parecia fazer contas à vida, treinaria um ajuste de contas?
Ela, podia ser um símbolo, uma luz mais forte, um hino, um exemplo, mas não. É apenas uma rapariga a quem lhe falta um olho, e que mesmo assim enfrenta o mundo. Enfrenta-o porque viver é mais importante que tudo o resto, fá-lo por saber que algo assim pode tornar-se num pormenor apenas. Fá-lo porque pode acreditar que a nossa beleza vem de dentro e ecoa por esse mundo fora com uma luz muito própria, e nada tem a ver com o número de olhos que temos.
Ela, com apenas um olho é capaz de ver o mundo por inteiro, eu acredito nisso. Ela, ontem à noite fez com que os meus olhos enxergassem melhor. Ela seria capaz de abrir os olhos de todas as pessoas do mundo que desistiram de ver com os olhos do coração.