sexta-feira, agosto 12, 2011

Para o meu pai

Subias as escadas rolantes que vinham do fundo do chão em direcção à luz do dia. Desviaste por um segundo a atenção dos teus pensamentos banais, e pensaste noutra coisa. Baixaste os olhos e ajeitaste os óculos de sol. Naquele instante pensaste no que perdeste, foi-te roubado. Nunca tinhas pensado dessa forma, foste atingida por um raio invisível e teimoso, nervoso e saudosista. Recordaste todas as pequenas coisas, gestos primários e doces. Rcordaste a voz e a forma, o cheiro e o olhar. Foi-te roubado. A meio da subida das escadas, levantaste o olhar, cerraste os lábios e franziste o olhar como quem fica confusa e indecisa. Sentirei a tua falta? E se o passado tivesse sido outro, gostarias do teu presente. Seria melhor? Recordaste o mês fatídico, o mês de Dezembro, o teu preferido que se estava a desmoronar. O frio da caminhada, a espera pelos autocarros, a vista da janela, os pingos de chuva que te encurralavam a qualquer hora do dia, o silêncio apenas quebrado pelo sol do televisor que a meio desse mesmo mês foi levado para outros a quem fizesse falta. Recordas o bolo de laranja húmido e as bolachas Maria integrais, um pacote verde garrafa com letras brancas e castanhas. Anos e anos depois apercebes-te que o mundo mudou desde então, perdeste e não sabes ao certo se recebeste algo em troca. A Vida é mesmo assim. Não esqueças a vida bonita que tens.

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