domingo, junho 20, 2010

Respiro entre Vento e Aguarela

(fotograma do filme, E tudo o ventou levou, 1939)
"Mais. Por favor."
Transbordo de sensações. Misto de embaraço e avidez, numa aparente calma movediça. Palavra como cor de aguarela aguada, ténue e translúcida.
E se a chuva vier? E se a impiedosa chuva vier e fazer desaparecer a aguarela da face da Terra. E se a chuva vier? Como é que se anda erguido debaixo da chuva? Aliás como se protege a aguarela para que não se misturem as cores?
Respiro. Por um pouco. A tela ainda ali está, a aguarela é que teima em secar.
E se fechar os olhos, por um momento que seja...será que o momento se esvai?
Abro as janelas para que a brise entre, se chegue a ela e num abraço fresco a faça secar mais depressa. O abraço descai num longo beijo entre apaixonados, o Vento e a Aguarela.
Respiro. Respiro mais uma vez. Nem sempre é fácil respirar, teima em sair, o ar amedrontado, mas mais não é possível. Respiro.
Gota de suór deslizante, entre os fios que definem os corpos. Respiro. Páro. Recomeço. Um respirar solenemente prolongado. E depois há aquilo que não se vê, que não se mostra, que não se materializa, a agurela não penetra. Respiro em pequenas doses enquanto o momento não chega.
Vento forte, capaz de destruir. Mas o vento é também elíxir quando chega em boa hora. A aguarela espera pelo vento, que é capaz de vaguear pelo mundo enquanto ela fica húmida e fresca entranhando-se na mais bela tela que quiseram pintar.
( E só escrevo porque ao escrever, respiro.)

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