sexta-feira, agosto 24, 2012

Quando os lugares onde já fomos felizes desaparecem



Quando os lugares onde já fomos felizes desaparecem
Já vos deve ter acontecido. Perder um lugar onde já foram felizes. Nós pessoas da cidade, temos essa capacidade fantástica de nos afeiçoarmos a “estabelecimentos”. Desenvolvemos hábitos e por melhores que outros sítios possam ser, acabamos por ir sempre aos mesmos lugares. Os lugares onde fomos felizes.

Se vivêssemos no campo não teríamos esse problema, à partida se uma árvore é cortada ela volta a crescer, se um arbusto desaparece encontramos um a escassos metros de distância. A envolvência do campo, a sua brisa, e a visão das libelinhas a esvoaçar apressadamente são para sempre, por ali seremos sempre felizes.

Na cidade não.

Os cafés e as pastelarias fecham. A primeira vez que me senti roubada cá dentro, foi quando um sítio (que embora tivesse um nome mais composto eu optei por apelidar de “Delícias”) fechou as portas.
Fui lá algumas vezes, bastantes até. Quando entrava naquele café de centro de comercial pequeníssimo imaginava-me num salão de chá londrino. As mesas pequenas em mármore, as paredes forradas a pano com o tecido típico inglês repletos de cenas de piqueniques, em que as senhoras usavam dez saias e os senhores uns chapéus com penas enquanto passeavam os seus galgos. O chá era servido bem quente, o bolo de chocolate e noz era um prazer infantil, a cada garfada sentia-me mais perto da perfeição. Os scones eram servidos com todo o requinte, e quando faltava o bolo de chocolate, a torrada e o chocolate quente substituíam-no sem ter de pensar muito nisso.
O Delícias fechou e levou consigo todo o charme que o Saldanha tinha. Deixei de poder ser feliz por ali.

Encontrei outro lugar, bem perto no Campo Pequeno. Era totalmente diferente, mais claro, mais despido, mais moderno. Adorava as senhoras e senhores que lá trabalhavam, fui lá tantas vezes que já me conheciam e até sabiam o que eu ia pedir! Um serviço de scones e um galão claro e bem quente.
Muitas foram as horas que ali passei a ler, a estudar outras vidas, a escrever sobre essas vidas. Muitas foram as pessoas que se sentaram comigo à mesa, foi lá que comecei a escrever sobre casais idosos, a sonhar com uma terceira idade assim. Onde irão eles agora beber o seu carioca a meio de tarde?

Fomos tão felizes.

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